por Valmir Nascimento
A apologética possui pelo menos três importantes funções.
Primeiro, ela fortalece a fé dos cristãos. Na medida em que se aprofunda nas razões da fé cristã, o crente alicerça ainda mais as suas convicções, servindo a apologética para dar consistência teológica aos cristãos em geral, afastando consequentemente a imaturidade e a superficialidade espiritual tão comuns nos nossos dias. O treinamento em apologética cristã, desse modo, é uma necessidade premente da igreja, notavelmente para capacitar aqueles que pretendem ingressar na universidade.
Mark Mittelberg[1] não poderia ter sido mais assertivo ao dizer da apologética, quanto a esse aspecto:
- Ajuda-nos a entender mais nossas crenças, à medida que nos inteiramos da evidência, da Bíblia e de outros sistemas de crença no esforço de ajudar nossos amigos a aproximarem-se de Cristo.
- Dá-nos clareza sobre o que cremos, tanto quanto uma prova final na escola nos ajuda a reunir tudo o que aprendemos ou deveríamos ter aprendido durante o trimestre.
- Dá-nos confiança acerca da razão de crermos no que cremos quando nossa fé fica exposta ao escrutínio e desafios que surgem.
- Dá-nos estabilidade espiritual, evitando que “sejamos […] levados em roda por todo vento de doutrina” (Ef 4.14).
- Amadurece-nos na fé e ajuda a nos moldar para a liderança na igreja, “para que [sejamos poderosos], tanto para admoestar com a sã doutrina como para convencer os contradizentes” (Tt 1.9).
- Amplia nossa capacidade de “[amar]Deus […] com toda a [nossa] mente” (Mt 22.37, NTLH).
Logo, embora muitos cristãos pensem que a apologética seja de uso restrito aos pastores e intelectuais, ela deve ser utilizada por todo cristão. Hanegraaf também argumenta que “um número demasiadamente grande de pessoas acredita que a apologética é do domínio exclusivo dos eruditos e teólogos. Não é verdade! A defesa da fé não é algo opcional; é um treinamento básico par todo crente.”[2]
Segundo, a apologética remove os obstáculos intelectuais e cria um ambiente favorável para a comunicação eficaz das boas novas. Ela abre caminhos a fim de que a mensagem do evangelho tenha livre curso. Gosto particularmente da palavra empregada por Alister McGrath: apreciação. Segundo o professor de Oxford, o apologeta possibilita que a verdade e a aplicabilidade do evangelho sejam apreciadas pelo público. “(…) O apologeta se empenhara para que o brilho e a beleza plena da fé cristã sejam compreendidos e apreciados”[3].
Embora estejam ligadas, vemos desde logo que apologética e evangelização são coisas distintas. Enquanto a apologética apresenta os argumentos do cristianismo, os fundamentos consistentes e a plausibilidade da fé cristã, a evangelização consiste na oferta – em si – do Evangelho, para que a pessoa venha ao arrependimento. McGrath explica que enquanto a apologética limpa o terreno para a fé em Cristo, a evangelização convida as pessoas a responderem ao evangelho; enquanto a apologética tem como alvo assegurar o consentimento, a evangelização quer assegurar o compromisso[4].
Considere as palavras do teólogo J. Gresham Machem:
“Falsas ideias são o maior obstáculo à recepção do evangelho. Podemos pregar com todo o fervor de um reformador e, mesmo assim, sermos bem sucedidos apenas em ganhar algumas poucas pessoas perdidas por aqui e por ali; e isso só tem acontecido porque permitimos que o pensamento coletivo da nação, ou do mundo, seja controlado por ideias que, pela força irresistível da lógica, impedem o cristianismo de ser reconhecido como algo mais do que uma mera ilusão inofensiva. Sob tais circunstâncias, o que Deus deseja de nós é que destruamos o obstáculo em sua raiz”.[5]
A apologética funciona como o abre-alas para a pregação do evangelho, preparando o ambiente intelectual para a correta compreensão da mensagem do Reino. A apologética é pré-evangelística. Ela esclarece conceitos, afasta equívocos, apresenta evidências, destrói falácias, desmascara ideologias, desfaz preconceitos e responde indagações. E a evangelização é aquela mensagem gloriosa; o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16).
Tenha em mente a situação na qual você tenta iniciar um diálogo evangelístico com um colega de sala de aula, afirmando a salvação proporcionada por Cristo Jesus. Agora imagine que esse colega apresente a seguinte objeção: – Não posso crer no que você está dizendo, pois não acredito na veracidade da Bíblia. A menos que remova essa objeção intelectual, você não estará em condições de prosseguir na explanação do plano redentivo para o seu colega de sala de aula. As portas para a comunicação efetiva do evangelho estarão trancadas. E o que a apologética faz? Ela remove esse empecilho explicitando porque as Escrituras são confiáveis.
Observe que a remoção do obstáculo intelectual não é o evangelho em si. Mas é um importante componente da evangelização. É uma condição sem a qual o evangelho não pode ser ouvido com clareza e em todo o seu esplendor.
Terceiro, a apologética possui uma função de tradução. Isto é, ela ajuda a apresentar o evangelho e as doutrinas cristãs de forma compreensível ao público não-crente. Essa função está ligada a anterior; contudo, enquanto aquela refere-se à remoção dos obstáculos, esta diz respeito à forma como a apologética contribui para explicação do evangelho por meio de imagens, termos ou histórias comuns ou acessíveis[6]. Alister McGrath escreveu: O que está em questão é em que medida transmitimos com fidelidade e eficácia a fé cristã a uma cultura que talvez não vá compreender os termos e conceitos tradicionais do cristianismo. Temos de ser capazes de expor e explicar a profunda atração do evangelho cristão para a cultura do nosso tempo, usando para isso linguagem e imagens que lhes sejam acessíveis.[7]
Referências
[1] MITTELBERG, Mark: Uma apologética para a apologética apud GEISLER, Norman; MEISTER, Chad: Razões para crer: apresentando argumentos a favor da fé cristã. Rio de Janeiro: CPAD, 2013, p. 20.
[2] HANEGRAAF, Hank. Cristianismo em Crise. CPAD: Rio de Janeiro, 1996, p. 15.
[3] MCGRATH, Alister. Apologética pura e simples: como levar os que buscam e os que duvidam a encontram a fé. São Paulo: Vida Nova, 2013, p. 17.
[4] MCGRATH, Alister, 2013, p. 20.
[5] apud CRAIG, William L., 2010, p. 16.
[6] MCGRATH, Alister, 2013, p. 18.
[7] MCGRATH, Alister, 2013, p. 18.
Estou preparando um material para estudo em grupo na igreja sobre apologética cristã, muito bom ver esse tema sendo abordado aqui meu caro irmão.
Excelente comentário acerca da apologética cristã. Inclusive estou me preparando para essa área. Quais livros devo ler para estar mais preparado?