No meio da polêmica que ocorreu após a declaração do Papa Bento XVI sobre o Islã, o Cardeal Walter Kasper, o Presidente do Pontifício Conselho para a Promoção da Unidade dos Cristãos, deu uma entrevista à revista alemã Der Spiegel que passou meio desapercebido entre nós. Há nessa entrevista (publicada na UOL, 19/09/2006) uma questão fundamental para o nosso tempo que merece ser refletida com calma.
A entrevista, como não poderia deixar de ser, foi em torno do difícil relacionamento entre a ‘Europa cristã’ e o islamismo. Após dizer que o islamismo é uma cultura diferente, o que não significa que seja inferior, ele afirmou que é uma cultura que ainda precisa se conectar aos valores positivos da sociedade ocidental moderna, como a liberdade religiosa, direitos humanos e direitos iguais para as mulheres. Mais adiante ele diz:
‘A Europa se considera uma sociedade de mentalidade liberal. Ela não pretende nem pode ser um ‘clube cristão’. Mas o experimento da Europa com o pluriculturalismo, a existência lado a lado de diferentes culturas, falhou em todo o continente. A integração exige uma base mínima de valores compartilhados, isto é, uma cultura de tolerância e respeito mútuos – em outras palavras, o que constitui o coração da cultura européia. É por isso que a integração não é possível sem excluir os que não reconhecem essa cultura. Os que não estão preparados para demonstrar tolerância não podem esperar ou mesmo pedir tolerância para si mesmos.’
A integração pluricultural da Europa não é possível, segundo o Cardeal, sem a exclusão dos que não reconhecem a cultura da tolerância (os islâmicos não-moderados); assim como ‘Os que não estão preparados para demonstrar tolerância não podem esperar ou mesmo pedir tolerância para si mesmos.’ Ele repete uma velha máxima defendida por Karl Popper, uma sociedade tolerante não pode tolerar os intolerantes. Para defendermos a tolerância na sociedade, precisamos ser intolerantes com os intolerantes.
Essa tese cria um pequeno problema. Ao sermos intolerantes com os que não aceitam a cultura da tolerância, nós nos tornamos também intolerantes. Portanto, um outro grupo que se vê como tolerantes poderia não mais nos tolerar porque passamos agora a ser intolerantes. E se esse grupo não nos tolera, se torna também intolerante e assim nós ou outros grupos também podemos excluí-lo da cultura da tolerância. E esse circuito não termina porque surgirão outros que serão intolerantes com o anterior que expulsou outro grupo … Tudo em nome da defesa da cultura da tolerância.
Um passo a mais nessa lógica. Se um grupo ou um país ‘A’ pressente que um outro grupo ou país ‘B’ vai tratá-lo como intolerante – isto é, expulsá-lo da comunidade dos tolerantes –, pode dizer que esse ‘B’ é intolerante porque não lhe tolera e expulsá-lo antes que ele tome a iniciativa. Seria a intolerância preventiva, exatamente a mesma lógica da guerra preventiva do governo Bush.
Essa lógica só não leva a um caos total se existir um ‘juiz’ capaz de conhecer acima de qualquer dúvida ou intolerância quem é o tolerante e o intolerante e impor uma decisão (expulsão do intolerante) que não possa ser questionada. É claro que no mundo globalizado de hoje não temos esse juiz. A ‘construção’ desse mecanismo de discernimento e decisão sobre questões como essa em nível mundial é objeto de uma grande disputa política e ideológica. É dentro dessa disputa que devemos analisar essa entrevista do cardeal Kasper e também a recusa do papa Bento XVI de pedir desculpa – mesmo que seja pelo mal entendido provado não intencionalmente – e a sua insistência de que foi mal interpretado.
Essa lógica só não leva a um caos total se existir um ‘juiz’ capaz de conhecer acima de qualquer dúvida ou intolerância quem é o tolerante e o intolerante e impor uma decisão (expulsão do intolerante) que não possa ser questionada. É claro que no mundo globalizado de hoje não temos esse juiz. A ‘construção’ desse mecanismo de discernimento e decisão sobre questões como essa em nível mundial é objeto de uma grande disputa política e ideológica. É dentro dessa disputa que devemos analisar essa entrevista do cardeal Kasper e também a recusa do papa Bento XVI de pedir desculpa – mesmo que seja pelo mal entendido provado não intencionalmente – e a sua insistência de que foi mal interpretado.
A insistência do papa em dizer que foi mal interpretado pode ser ‘interpretada’ como a afirmação de que o problema está não na sua afirmação, mas naqueles que não souberam interpretar corretamente a verdade dita por ele. Pedir desculpa seria um bom caminho para melhorar o diálogo – afinal, quando estamos realmente interessados em manter diálogo com alguém pedimos desculpas também por mal entendidos involuntários –, mas fazer isso seria reconhecer que o cristianismo e a Europa Cristã não são o último critério da ‘verdade’, da ‘civilização’ e portanto da definição de quem é o guardião da tolerância que pode e deve expulsar ou ‘enquadrar’ os ditos intolerantes.
Jung Mo Sung. Professor de Pós-Grad. em Ciências da Religião (Univ. Metodista de S.Paulo).
Como age uma pessoa intolerante?
Obrigada!
“És mestre (em Israel) e nã sabes isto (Jo 3.10)?”
As piores intolerâncias registradas na Palavra do Senhor estão no novo Testamento, com crentes e mestres que pensavam que sabiam tudo. Jesus diz: “não quer pra vc, ñ faça pra ninguém. Quer pra vc, faça primeiro (Mt 7.12)”. O que eu aprendo com o Mestre é que, se eu tenho que chamar tua atenção, te repreender, primeiro tenho que me colocar em teu lugar. Ser vc, e imaginar se gostaria de ouvir esta repreensão de alguém. É o lavar os pés, coisa que nunca vemos em nosso meio. Mas o que é mais bonito é viver de teoria, falar, convencer com letra, sem ter feito a experiência em um laboratório, ou ir ao campo e confirmar nossa tese. Quando aprenderemos que somos, como diz Paulo, “os mais intolerântes (miseráveis) da terra???
Fiquem na paz de Cristo. diacers@yahoo.com.br
Elizeu
ORIVELLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLLL